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Mostrando postagens de junho, 2007

A vida da palavra

"Ai, palavras, ai, palavras, que estranha potência a vossa! Ai, palavras, ai, palavras, sois de vento, ides no vento, no vento que não retorna, e, em tão rápida existência, tudo se forma e transforma! Sois de vento, ides no vento, e quedais, com sorte nova! Ai, palavras, ai, palavras, que estranha potência, a vossa! Todo o sentido da vida principia à vossa porta; o mel do amor cristaliza seu perfume em vossa rosa; sois o sonho e sois a audácia, calúnia, fúria, derrota..." (MEIRELES, Cecília. Das Palavras Aéreas. In.: Romanceiro da Inconfidência.) A cada batida do coração o homem pensa que ama. Se a palavra não existisse, como amaria o homem? A cada lágrima que do rosto cai, o homem diz que sofre. Se a palavra não existisse, como choraria o homem? A cada abraço apertado, imagina o homem a amizade. Se não se fizesse a palavra, como se irmanaria o homem? A cada palavra pronunciada finge o homem revelar-se. Se não houvesse palavras, que significado teria o ho...

METAde

Eu estou aqui. Às vezes estou inteira Às vezes em pedaços. E cada pedaço de mim me emociona e me apavora e me faz crer que a vida não é só isto que se vê por entre frestas/festas. É um pouco mais de pedaços que se unem entrecortados e que partem amedrontados às vezes até emocionados.

NaveG(E)aNTE

A sacola lhe pesa nos ombros. Na mão direita mais dois pacotes vagabundos em papel pardo lhe escorregam continuamente forçando-a de vez em quando a empurrar-lhes contra o corpo para não deixá-los cair. As compras se resumiram a um amontoado indigesto de enlatados, porque já não tem paciência, tampouco fogão e gás para cozinhar. Caminha pela rua e conta automaticamente os quadrados da calçada que faltam para alcançar a porta do prédio onde mora. A sacola lhe pesa, mas não a tira nem por um momento do ombro, embora o peso e a alça fina cortante da bolsa já lhe deixem marcas vermelhas. Ali estão coisas que lhe são o mais precioso que tem e ela não deixa nem por breve minuto a bolsa escapar-lhe do alcance da mão e dos olhos. Ali estão vinte e cinco anos de trabalho. Ao chegar em casa, abre os pacotes, arruma as coisas no armário, prepara um suco rápido e engole o sanduíche natural que comprara na lanchonete a caminho de casa. Coloca a sacola sobre o sofá e vai tomar um banho quente que pos...

ArrE!!!

Há anos que Roberto Carlos canta que "além do horizonte deve ter um lugar bonito pra viver em paz" e vez por outra o que queremos mesmo é fugir, deixar esse dia-a-dia em busca de um novo horizonte. O danado é que o horizonte nunca está fixo, anda e anda, à medida que dele nos aproximamos. Nesse distanciamento queremos o horizonte quando o que está perto nos parece insosso, sem sentido, aborrecido, inclusive nós mesmos. Assim como o horizonte, também nossas carências e quereres nunca são os mesmos, mudando, mudando. Podemos nos aborrecer pelas coisas mais corriqueiras ou por coisas vultosas. É aquela estória de se engasgar com uma formiga e engolir um elefante, dependendo muito de nossa resistência, do quanto de paciência já foi usado. É aquela gota que faz o copo transbordar. Em momentos assim, melhor não escrever, não conversar, nem mesmo namorar, porque termina sobrando para quem está muito próximo. Trabalhar é um sacrifício porque as coisas cotidianas enchem o saco, ler é...

La vérité

Ontem comprei o dvd de um filme lançado em 1957: Doze homens e uma sentença (com título em inglês bem sugestível à situação - 12 angry men), cuja sinopse é assim apresentada no site Cine Player: "Doze jurados devem decidir se um homem é culpado ou não de um assassinato, sob pena de morte. Onze têm plena certeza que ele é culpado, enquanto um não acredita em sua inocência, mas também não o acha culpado. Decidido a analisar novamente os fatos do caso, o jurado número 8 (Henry Fonda) não deve enfrentar apenas as dificuldades de interpretação dos fatos para achar a inocência do réu, mas também a má vontade e os rancores dos outros jurados, com vontade de irem embora logo para suas casas." Já tinha visto o filme há cerca de três anos e ficara fascinada com o jogo de possibilidades para um mesmo fato que um dos jurados, no caso o oitavo, interpretado por Henry Fonda, vai desmontando e reconstruindo à medida que põe em dúvida as conjecturas apresentadas pelos demais. Evidencia-se a ...