Concentramo-nos tanto no trabalho que muitas vezes não sabemos apreciar o belo. O som da música que ameniza o cansaço, que compartilha. Um ouvindo, outro cantarolando baixinho, comentando uma época, lembrando um amor, uma vida. Gostos são diferentes e é na diferença que crescemos. Nem sempre é fácil, mas hoje e sempre necessário se quisermos nos livrar da solidão. Na guerra travada todos os dias qualquer coisa irrita, esmaga o peso sobre os ombros, arrebentando todas as cordas em que se transformaram os nervos. A custo seguramos o grito, a mão, o pontapé - se não físico, o verbal se dispara e alcança o alvo. Aberto ao ir, a volta nos alcança ainda em meio ao grito. Esquecemos o essencial. Esquecemo-nos de nós mesmos e da compreensão para alcançar o outro tão igual a nós e ao mesmo tempo tão diferente. Esquecemos que o arco-íris é belo pelos seus matizes de cores, não pela igualdade. Desrespeitamos o outro, o gosto, a vida se tornando amarga por se fazer sozinha. Nessa ausência, castiga...
A poesia está guardada nas palavras — é tudo que eu sei. Meu fado é o de não saber quase tudo. Sobre o nada eu tenho profundidades. Não tenho conexões com a realidade. Poderoso para mim não é aquele que descobre ouro. Para mim poderoso é aquele que descobre as insignificâncias (do mundo e as nossas). Por essa pequena sentença me elogiaram de imbecil. Fiquei emocionado. Sou fraco para elogios. MANOEL DE BARROS