No meu ombro pousou uma esperança. Não a metáforica, que tantas vezes se revela ilusória. Mas, a real, o inseto verde e saltitante, raro nas paragens urbanas. Em que pese a semelhança com o início do texto Uma esperança , belamente escrito por Clarice Lispector, é verdade. Em mim, ao acordar na manhã de primeiro de janeiro, no espaço exíguo entre banheiro e quarto, pousou uma esperança, inseto também conhecido como louva-a-Deus. Não sei de onde a esperança surgiu, embora se estivesse na minha casa seria ainda muito mais espantoso, pois esperança é raro se vê em lugar tão urbano. Entretanto, no interior é normal, embora no quarto a janela existente estivesse fechada, como passara a noite toda e dificilmente teria passado tão despercebida pela cozinha e sala para chegar ao quarto. Não importa de onde veio. Pousou no ombro e como não sou dada a sustos repentinos, lá ficou um tempo até pular para a cama, desta para o chão onde não mais encontrei. Se possuidora de mimetismo, deve ter se co...
A poesia está guardada nas palavras — é tudo que eu sei. Meu fado é o de não saber quase tudo. Sobre o nada eu tenho profundidades. Não tenho conexões com a realidade. Poderoso para mim não é aquele que descobre ouro. Para mim poderoso é aquele que descobre as insignificâncias (do mundo e as nossas). Por essa pequena sentença me elogiaram de imbecil. Fiquei emocionado. Sou fraco para elogios. MANOEL DE BARROS