Sempre poderia não ser. Como são os dias desde a hora que passo pela porta de um ônibus que me leva para onde me fecho entre paredes, janelas de vidros sujos e entre frestas vejo ruas e gentes. Gentes iguais a mim por fora e por dentro tão diferentes diferente com tua saia e trança e calças e paletós dos teus pensamentos, sentimentos que não me são mais, nem me chegam e mesmo assim me cegam o que vai por dentro anuviando os amanheceres e noites madrugadas quase sem fim quando o telefone ao meu lado repousa barulhento infiltrado dos meus pensamentos, dores desejos de voz, abraços pimentas chocolates e cafés.
A poesia está guardada nas palavras — é tudo que eu sei. Meu fado é o de não saber quase tudo. Sobre o nada eu tenho profundidades. Não tenho conexões com a realidade. Poderoso para mim não é aquele que descobre ouro. Para mim poderoso é aquele que descobre as insignificâncias (do mundo e as nossas). Por essa pequena sentença me elogiaram de imbecil. Fiquei emocionado. Sou fraco para elogios. MANOEL DE BARROS