Faz tempo que deixei de acreditar em inferno nos termos religiosos. Da Divina Comédia não sei o suficiente para dizer que acredito no inferno dantesco. Possivelmente. Mas, que na vida tem um bocado de aperreio, ah, isso tem! Os que nós provocamos. Os que os outros nos provocam. Destes, para mim o mais recorrente é o de pessoas quererem me enterrar viva. Não sei o porquê. Quer dizer, suponho. Apenas. Fico quieta, não me interesso pela vida alheia. Há muito deixei de dar conselhos, cada um viva como quiser. Tudo tem um preço, mas as pessoas insistem em não acreditar nisso. Depois, reclamam daquele erro cometido, daquela omissão ou daquela agressão, nem sempre física, muitas vezes psicológica. Tenho medo, não. Dificilmente, fico calada nas horas de opinar, embora já me dê o direito de não opinar por aquilo que não vale a pena. Meu trabalho, por exemplo. Vale. E falo, como se diz no interior, para dedéu. (Quer dizer, muito). Educação é função difícil de se exercer. Todos que...
A poesia está guardada nas palavras — é tudo que eu sei. Meu fado é o de não saber quase tudo. Sobre o nada eu tenho profundidades. Não tenho conexões com a realidade. Poderoso para mim não é aquele que descobre ouro. Para mim poderoso é aquele que descobre as insignificâncias (do mundo e as nossas). Por essa pequena sentença me elogiaram de imbecil. Fiquei emocionado. Sou fraco para elogios. MANOEL DE BARROS