sábado, março 24

Hoc Opus, Hic Labor Est

Mesmo cansada, quando cheguei à noite, liguei o televisor na tentativa de ver alguma notícia nos últimos telejornais. E ouvi o apresentador anunciar que em documento intitulado Sacramentum Caritatis (O Sacramento do Amor) o Papa Bento XVI sugere aos padres que voltem a rezar as missas em latim; que o canto gregoriano volte a ser entoado nas igrejas; que o casamento de divorciados é uma praga e que políticos católicos fiquem atentos para a não aprovação de leis liberais que atentem contra a família e a vida (traduzindo: não aprovem leis a favor de casamentos homossexuais, a eutanásia, o aborto); que os padres evitem a confissão comunitária, que o momento de confraternização na hora da missa, aquele que todo mundo se abraça e deseja paz, não seja longo provocando distração e que os padres cuidem esteticamente das igrejas, isto é, limpem direitinho os altares e os santos. Amém.
Religião é uma coisa complicada e quem tem bom senso não a discute. O que seguirei aqui. Depois que inventaram que crença e religião formam um par inseparável, tem muito nego aí ficando doido devido a conflitos íntimos entre o seu querer e o querer da Igreja, tem muita gente matando em nome de Deus – seja lá de que religião for. (Uma das passagens literárias mais impressionantes que já li é a que tem no livro O Evangelho Segundo Jesus Cristo, quando o autor, José Saramago, descreve o quanto de gente morreu em nome de Deus).
Vai ser uma comédia os padres falando latim novamente, eles que já esqueceram e outros que nem sequer aprenderam, pois o latim foi abolido em meados dos anos 60 pelo Concílio Vaticano II. Só quero ver o povo da Carismática fazer todos os movimentos gratis pro Deo em latim! Os mineiros é que vão ficar felizes. Afinal seu lema vai voltar à moda: Libertas quae sera tamen!
Que o mundo tá louco não é necessário reafirmar aqui; que há uma falta de valores entre as pessoas, pelo menos de valores humanitários, é visível até para quem não quer vê, mas até que ponto essas medidas vão colocar um freio nos atos insanos praticados diuturnamente pelo mundo? Será que ouvindo a missa em latim os fatos abaixo não mais acontecerão?
1. Uma menina de 04 anos foi levada para uma delegacia em Belo Horizonte porque a mãe de um coleguinha da mesma idade deu queixa porque o filho tinha recebido uma pedrada desferida pela niña. A mãe do garoto, residente no bairro Floramar, chamou a polícia e seis policiais militares e três viaturas compareceram ao local. A garota ficou detida por três horas acompanhada pelo pai, que, terminada a confusão, está processando o sargento da PM que atendeu o chamado (talvez em Belo Horizonte não haja tantos casos necessitando de atenção policial, já que foi toda essa tropa prender a garota; talvez os pais mineiros - como tantos outros pelo mundo - não tenham tempo de conversar com seus filhos, tampouco com os pais dos colegas dos seus filhos para resolver questões afins);
2. Na Austrália, uma senhora, querendo testar o sistema de segurança do Banco, forneceu o nome do seu gato como dependente a um cartão de crédito. Dias depois, o seu cartão e o do gato estavam na sua residência (resta saber se o gato vai utilizar o seu para comprar exclusivamente salmão!);
3. Uma estudante residente no bairro carioca de Vila Isabel surpreendeu-se com uma bala a fazer um prosaico misto-quente. Não que a bala estivesse à deriva, de tantas perdidas que há pelo Rio, mas estava bem acondicionada na terceira fatia de pão que ela retirou da embalagem. O pão fora fabricado no dia 28 de dezembro, mesmo dia em que o Rio se transformou numa Beirute nas mãos de bandidos;
4. Um site na Internet criou o Prêmio Darwin para homenagear as mortes mais bobas acontecidas a cada ano. Em 2006 o vencedor foi um casal de americanos que morreu de insuficiência respiratória a bordo de um balão a hélio.
Os fatos acima foram retirados da revista Ciência Criminal, número 6 e mostram bem os absurdos a que chegamos. Mostram principalmente que estamos perdendo tempo com as aparências e deixando a essência da vida acabar em meio a frivolidades. Não que Religião seja uma frivolidade, mas atribuir uma reforma de valores à ressurreição de uma língua morta há tempos é mascarar a realidade, fugindo de soluções práticas e realísticas.

(A propósito: o título é uma expressão latina atribuída ao poeta Virgílio e significa "Aí é que está a dificuldade"!).

2 comentários:

Anônimo disse...

Fiq preo ñ Dnice, Nando Reis ainda canta "O mundo é bom Sebastião", os anjos ainda dizem amém, ainda resta a fé...

Hoje: Dies incertus, mas Dias melhores virão!!!

Roberta Assunção disse...

Eu acho que a tendência é ainda piorar antes de dar a volta por cima. O papa faz isso, por exemplo, pra ver se as coisas voltam aos eixos certos. Mas que eixos mesmo elas deveriam ter?!