sexta-feira, junho 27

Ôrra meu!

Não sei se a Língua Portuguesa está se tornando de verdade “a última flor” ou se eu é que sou purista demais. Mas, o que estão fazendo com o idioma “de minha pátria, de minha pátria sem sapatos/ e sem meias pátria minha/ tão pobrinha” – como diria o Vinícius – é uma coisa de louco, ôrra meu!
Não vou dizer que todo professor de português fica danado da vida quando ouve e lê os absurdos, porque, infelizmente, alguns colegas derrapam nas coisas mais comuns (o tal de
a nível de pega e derruba muita gente). Quem faz da leitura uma dose diária melhor que qualquer lexotan fica paranóico quando presencia atos de verdadeiro vandalismo cometidos na língua. O vandalismo do muro às vezes escreve certo por linhas tortas. Em um muro está escrito em letras garrafais – como não poderia deixar de ser: “o verdadeiro governo assiste ao povo”! E não é que é mesmo! O verdadeiro governo está vendo o que se passa com o povo, mas não está dando a assistência necessária, quer dizer, o governo não assiste o povo – era isso que o grafiteiro queria dizer. Ato falho?
Estou quase sem tempo de ver televisão, mas lá por volta das dez, onze horas da noite existe um noticiário local que é um celeiro para qualquer professor. O tal é daqueles programas cuja pauta é recheada de casos policiais, entrevistas com populares no local da ocorrência, um repórter esbaforido literalmente correndo atrás da notícia. No calor da hora – que aqui na cidade é toda hora! – o camarada fala verdadeiras pérolas.
Outro dia ele noticiava a morte de um casal de namorados atingido pelo trem. Depois das locações, já terminando a matéria, ele solta: todos os moradores ficaram horrorizados com a grandeza desse acidente!!!! Grandeza, cara, grandeza! Se eu fosse parente dos infelizes tinha processado esse repórter por desrespeito à dor alheia. Antes ele já vaticinara com muita propriedade que “o homem e a mulher acabaram tendo morte fatal”. Estou curiosíssima para conhecer esse rapaz e perguntar-lhe qual morte não é fatal, pois é desse tipo que quero morrer.
Por sua vez, a apresentadora do programa não deixou por menos. Comentando essa mesma notícia, chamando a atenção para o perigo de uma via férrea em área urbana, apelando às pessoas terem cuidado, porque “mais vale perder um minuto na vida do que a vida num minuto”, ela concluiu dizendo que “é muito perigoso, mas no entanto é necessário redobrar os cuidados”!!!!!! Como se pode entender, ela provou que não vai admitir que um repórter erre mais que ela, ela tem que errar em grande estilo. Não só usou duas conjunções de mesmo sentido, como anulou completamente o significado da primeira oração, pois as conjunções têm valor de idéias contrárias, as famosas adversativas. Para ela dizer o que queria, bastava usar a conjunção aditiva e ou a conclusiva por isso (Em tempo: esse mesmo
por isso já causa sua própria confusão).
Depois de tantos assassinatos lingüísticos, a apresentadora transformou-se numa serial killer e atirou uma bala pleonástica: voltaremos depois de um pequeno breve intervalo!
O uso do gerúndio é outra praga junto a tantos outros descaminhos. Estou cansada de ouvir “a gente teria de estar atuando”, “não tinha como a gente estar trabalhando isso”, “nós enquanto educadores somos mal reconhecidos”, e uma expressão novíssima no embalo da exibição: você não está gestionando isso! Pelas caridades, essa doeu quando ouvi, porque a tal moça estava se referindo a uma forma de gestão.
É inadmissível que pessoas que usam o idioma como instrumento de trabalho não tenham a decência de falar corretamente. Não importa o nível de escolaridade do ouvinte. Falar corretamente não é falar difícil, usar um vocabulário incompreensível. A comunicação é importante, nem por isso se deve relaxar e ficar usando tá ligado? a torto e a direito, pensando que de outro modo não será entendido.
Contudo, melhor é ler sobre quem sabe escrever e ganha
prêmio por isso (ainda mais que estou falando de cria de casa, meu lado tia). Afinal, “esse é o menor dos maus causados” como me escreveu uma amiga inconformada por ter ouvido uma repórter usar maus e não males!
Fazer o quê, cidadão??????

2 comentários:

Anônimo disse...

A ultima flor... ficou lá do outro lado do atlantico e se não erro era "iculta e bela".
Presta atenção 'tia' que vc tbm pode achar alguma beleza nessa "nossa lingua brasileira" inculta e miscigenada.

Anônimo disse...

Estava navegando e por acaso achei este blog, adorei o que li não só pelo que vc diz mas a maneira inteligente e bem humorada como coloca suas idéias torna deliciosa a leitura. É importantissimo mesmo que jornalistas tenham mais respeito com o idioma que falamos.
Adorei o blog, virei sua fã.