Caiu água
demais na terra. Caiu água demais nos rios. Aquilo assombrava o pai que repetia, fim dos tempos, fim dos
tempos. A mãe tentava colocar as coisas lá para cima, mas não adiantava. A água
subia depressa demais.O jeito era
sair. Fazer uma trouxa com o que pudesse e sair na água dos joelhos para cima,
e da água da cabeça para baixo fria e constante. Na escuridão
dos postes, gente inumana roubava, atacava, dividindo espaço com entulhos,
caixas que boiavam, carros parados na lama. Pessoas
procuravam parentes, aderentes como os animais, agregados como os amigos e
choravam ao saber da enxurrada que levara fulano, derrubara a casa de sicrano.
No meio de tanta água não encontravam água para beber, banco para sentar, cama para dormir. Caminhões
com soldados chegavam a toda hora. Era uma guerra diferente. Gente passava aos montes pelas ruas transformadas
em rios, canoas e remos em vez de carros e buzinas. As crianças
choravam em busca de leite, brinquedos levados pelas águas, escondidos na lama,
roupas de quem ninguém sabia vestiam agora todos na condição de carentes. O mundo todo às avessas passa na televisão. Em cores. Preto e branco só as dores de cada um.Imagem em https://pt.pngtree.com/freepng/torrential-rain--flood-control--flood-fighting-house-collapse_8637300.html
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