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Inefável

"Não te doas do meu silêncio.
Estou cansado de todas as palavras:
- Não sabes que te amo?
Pousa a mão na minha testa.
Captarás numa palpitação inefável
O sentido da única palavra essencial
- Amor."
Esse é um dos poucos poemas que sei de cor, pois há muitos anos dele me utilizei para dar uma aula. E lia nele pela primeira vez a palavra inefável, tão desconhecida que fui em busca do dicionário para decifrá-la. Desde então, o poema de Manuel Bandeira sintetiza pra mim muitas coisas que há na vida, entre elas o amor sentido e tão difícil de ser expresso por palavras.
Ser inefável bastaria para designar o amor, mas teimamos em desvendá-lo, como se palavras postas no papel ou ditas – às vezes até mal ditas! – a alguém pudessem ser mais precisas do que o sentimento em si. Da mesma forma que erramos quando muito falamos, podemos errar ao ficar calados. Para o amor não deveriam existir palavras, nem mal entendidos, silêncios carregados, choros desesperados ou arrependidos.
Ao amor deveria se bastar nossa verdade sem palavras, “tão contrário a si é o mesmo amor”.
Foto da postagem by José Marafona.

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